quarta-feira, 17 de junho de 2009

um feitiço aromático e amargo (1ª parte)

De repente, um homem alto num roupão roxo de dormir de veludo com uma fita de seda vermelha, e de cabelo ruivo, rebelde, curto, entrou dentro da suite, seguido por um enorme tigre de estimação, de pelo farfalhudo e fofo, rosnando com uma voz terrível e zangada, parecendo acalmar até ao mais feroz dos furacões. Com uma boquilha de âmbar preta nos lábios e luvas de cabedal a cobrir as garras afiadas e desumanas assustavam imenso princesa, mas o que mais a perturbava eram o conjunto no seu todo, ficava aterrorizada só de pensar que tinha sido enganada por um homem como ele, aceitando comida vinda da cozinha dele…! Como é que poderia ser ingénua a tal ponto!?
As acusações que ele tinha feito à sua mãe, não podiam de forma alguma serem verdadeiras. Ela e Indra amavam-se, e não havia outra maneira de explicar esse facto. Com aquela cobra venenosa, era preciso ter-se o maior dos cuidados.
Os olhos verdes e penetrantes do homem perscrutavam a lamuriosa Ariana, e, quanto mais a fixavam, mais paralisada ficava. Estava cheia de medo, embora não o pudesse demonstrar, e, isso, era uma cena horrível de se ver para a outra jovem. Um frio tremendo congelou o corpo inteiro da rapariga, antes que ela pudesse fazer alguma coisa, e, petrificada, muito branca, quase sem poder se mexer, viu os pés cobertos pelos chinelos de linho azuis do feiticeiro aproximarem-se cada vez mais, num ruído surdo.
O fumo que geralmente, acompanhava Samiel, não se fez esperar, e, subitamente, uma onda de fumo de hortelã-pimenta mergulhou a pobre fada num sono hipnótico, sem que esta pudesse manter-se consciente, do que se estava a passar.
- Ariana. – A voz aguda do feiticeiro ecoou gentilmente em toda a sala, como se fosse um sibilo trazido pelo vento. – Já não devias estar a dormir?
Eleonora sentiu um arrepio quando a sílfide respondeu num tom insensível, e dormente, quase o mesmo que ela usara para se apresentar à princesa:
- Meu senhor. – Ela dizia aquilo num tom tranquilo e adormecido, como se estivesse a bocejar.
A garra direita do feiticeiro apontou por fim para a porta que dava acesso até ao corredor.
- Então vai lá dormir, minha querida. – Sussurrou novamente o feiticeiro, acariciando os caracóis dela com uma estranha ternura. – Vai para a tua caminha, que já são horas de tu estares a dormir, meu pirilampo.
Imediatamente, a rapariga, não obstante, obedeceu, dando os seus pequenos passinhos, qual sonâmbula, num estado completamente inconsciente, não escutando nada do que as pessoas poderiam lhe dizer, pois ela, agora, estava sob o poder do feiticeiro.
Aquilo dava imensos calafrios à princesa, pelo que esfregava constantemente os braços com o ronronar subtil do gatão do senhor do castelo.
Odiava-o, pela sua forma de ser, por disfarçar os seus sentimentos, pelos seus olhos verdes de réptil, por aquela língua peçonhenta e venenosa, e, só de pensar que, qualquer dia, aquele poderia ser o seu aspecto, que poderia vir a tornar-se numa das escravas do Assassino do Amor!... Nem que estivesse morta! Ela preferiria escapar do que ter de aturá-lo, todos os dias, com as suas exigências bizarras e aterradoras.
Mal a rapariga desapareceu pela porta, enlevada por algum dos feitiços daquele bruxo malvado, ela engoliu em seco, ao ver que o sorriso cínico do homem esmorecia num olhar frio e prepotente, olhando-a com um ar autoritário e indiferente, com as mãos atrás das costas.
Encolhida em cima da cadeira feita a partir de madeira de oliveira, ela reparou que o homem continuava de pé, com aqueles olhos gélidos.
- Então, Eleonora? – Perguntou num tom sarcástico. – Não gostas dos presentes que te ofereci de livre generosidade?
Ela limitou-se a virar-lhe costas, tentando não enfrentar os olhos esmeralda e de lobo, consumidores de mil fogos, a olhá-la, como se a quisesse devorar com o olhar.
- É uma pena. – Suspirou num tom desagradável. – Mas eu gosto da tua teimosia, gosto muito dela.
A seguir, sentando-se confortavelmente ao lado dela, retirando quase de maneira inocente, dos bolsos um frasco do qual saiu um pozinho vermelho, ele misturou-o de maneira desleixada, com a boquilha e o tabaco, na água.
Minutos depois, saía uma fumaça inacreditável do líquido vermelho, dissolvido na água potável do jarro, uma espécie de fumo roxo, que tomava as formas duma serpente. O Tigre da Escuridão tentou, curioso, cheirar aquela estranha bebida, mas, logo que pôs o focinho grande dentro do jarro de barro, espirrou com um barulho incrível.

1 comentário:

Anónimo disse...

Nossa, suas palavras são incríveis.

Queria saber se já tem livros seus lançados.

Eu fiquei tensa, com o ombro duro vendo-a sair do aposente, e esse feiticeiro é bem dum homem mal, ele é atemorizante.

Parabéns, mil vezes parabéns!