quinta-feira, 23 de abril de 2009

"Alea jacta est" - que os jogos comecem (Parte I)

O aroma a rosas perfumadas e a cravos vermelhos inundavam uma suite ampla e bem iluminada, num estilo predominantemente neoclássico, vitoriano, com pétalas de lilases e suaves camélias a encher o quarto dum requintado perfume, a rapariga parecia ter a sensação que estava a andar nas nuvens, descalça. Com um vestido vermelho de seda, sem abas, com uma saia larga cheia de pregas e rendas, e uma cintura rosada a adelgaçar as ancas pequenas, ela caminhava sob o chão de algodão com relativa facilidade, parecendo que voava….tocando nos brincos de ouro branco esféricos a pender de fios de prata, sob as orelhas delicadas, pequeninas e pontiagudas, ela quase que jurava estar num sonho.
Ajeitando com cautela a tiara composta de fio de prata, com duas jóias de ametista e um rubi pequeno no centro da testa, como um terceiro olho, a jovem fada soltou um longo suspiro. Tudo aquilo era lindíssimo, e, quando já passava da meia hora da manhã, ela nem pôde acreditar; Eleonora estava lindíssima, maquilhada, com os lábios pintados de vermelho pudico, que lhe ficava muito bem com as faces de pó-de-arroz e com os olhos castanhos brilhavam sobre o rímel castanho, tímido e discreto.
Tinha de confessar a si própria, estava enfeitiçada pelo charme e luxo inacreditável de Samiel, era, sem dúvida alguma, o homem que ela conhecera com melhor gosto para agradar às mulheres, ele era um génio do mal com um poder especial sobre elas, parecia poder entendê-las tão bem, não conseguia dizer-lhe que não. Porém, ele era frio, severo e implacável contra os seus inimigos, não gostaria nada de o irritar qualquer dia.
Estava um calor impressionante, e a luz das três velas, colocadas apropriadamente sobre a mesa redonda de carvalho castanho, atoalhada por um lençol enorme, rosado, às pintas, não ajudava nada, ela mal podia respirar, ou seria do súbito nervosismo que sentia ao saber que iria estar sozinha com o verdadeiro Assassino do Amor em pessoa. Não gostou nada da ideia de que ela fosse trocada por uma nereida, mas, lá teve que aceitar, com uma tristeza desiludida, observar, por um buraco na parede da câmara por onde os homens do senhor do castelo lhe tinham levado, os beijos atrevidos de Indra, a tocar nos seios de outra mulher, que não era ela. Aquela rapariga, aquela criatura, que os Bruxos tinham apresentado à sociedade de elite bellante, não era mais do que um pequeno chamariz para desviar a atenção da verdadeira vítima da perversidade do bruxo: a verdadeira prisioneira, a Princesa Eleonora, ela mesma, sem um único sitio ou possibilidade de fugir.
Sentada na cadeira, à beira da mesa, ela mal sabia o que é que seria dela, que agora era prisioneira daquele bruxo perigoso e cruel, sem o seu amado para a ajudar…! Que teria feito para aborrecer os Deuses?... Ela apenas pedira um homem diferente do aborrecido, possessivo e atrevido Indra…Seria demais, e, em vez dum príncipe encantado, saíra-lhe na rifa, um dragão malvado.
Enfim, a vida continuava, e, ao ajeitar os seus brincos, reparou num toque, suave e respeitoso, que agora era mais brando que da última vez que lhe tinham pedido para mudar de roupa.
Quem quer que fosse, que se despachasse, pois ela não tinha tempo a perder, quereria ir-se embora mal amanhecesse, mesmo sem aquela produção toda.
Não gostava nada de se sentir como se fosse uma bonequinha de plástico, a qual aquele feiticeiro poderia vestir e decorá-la como ele bem entendesse.
Mesmo que fosse muito educado da parte dele, não iria aceitar aqueles presentes todos de mão beijada. O toque da porta foi mais insistente, e acabou logo por dizer:
- Entre.