sexta-feira, 29 de fevereiro de 2008

O Rei dos Bruxos! (Informação)


Por várias décadas – mil anos aproximadamente – Samiel governou sob toda a comunidade dos Bruxos em todo o Mundo conhecido.
Mas…O que é que aconteceu quando este morreu de velhice no seu milésimo aniversário?... Tal como era de prever, sucederam várias batalhas sangrentas para saber quem seria o melhor Rei dos Bruxos, o novo Assassino do Amor: a Guerra de Poriavostin, a Guerra dos Puros, que demorou novecentos anos!
Em setecentos d.C., Enoque Pedro Di Euncätzio sentou-se verdadeiramente no trono do seu tio, reclamando-o por direito de seu discípulo mais fiel e herdeiro do seu enorme poder. Enoque foi um rei justo, e muito bom, castigando e presenteando com a mesma dignidade e requinte. A seguir, em 1200, seguiu-se-lhe um antigo carrasco de Samiel, Bernard D’Joll, um bruxo frio e sem escrúpulos nenhuns, que, mal se encostou ao trono, viu-se logo que não era boa pessoa.
Habituado ao típica superioridade dos Bruxos sobre todas as restantes criaturas, decidiu declarar guerra ás Fadas, com os seus “deprimentes e miseráveis sentimentos”, banhando-se em sangue numa batalha contra as Fadas. Em 1400, o entiado Gelrar tomou as responsabilidades, o que foi um grande alívio para a nossa sociedade.
No século dezoito, já não aguentávamos tantas guerras, por isso, decidimos servir Neptuno, protegendo-nos das fogueiras humanas.
Isto leva-nos até Kzenah Malagheti, que, nos finais do século, em 1780, destitui diplomaticamente o Rei Lebomi – de origem japonesa por sinal – e declara que daí em diante, as eleições para se tornar Rei dos Bruxos serão feitas de cem em cem anos, segundo uma balança, na estimativa de noventa até cinco candidatos.
Malagheti, em 1930, concordou com a Serpente de Fogo – talvez a única coisa em que aqueles dois concordaram – para fundar a SPV.
O meu Padrasto foi a excepção em pessoa! Primeiro porque só tinha trinta e seis anos mal lhe anunciaram que tinha sido eleito Rei dos Bruxos, segundo porque era um mortal, que não tinha quaisquer ligações com a Magia Negra.
Há mais reis dos bruxos para alem destes, mas os que de te falei são os únicos mais famosos em toda a Dimensão Mágica. Nos tempos da Época Medieval, do Renascimento e da Era Clássica até à proclamação de Kzenah Malagheti, houve entre os Bruxos várias intrigas, assassinatos, batalhas e conspirações para saber quem seria o próximo senhor absoluto da Magia Negra, resultando em terríveis guerras com as restantes classes, com os Humanos incluídos.

domingo, 24 de fevereiro de 2008

O Encontro (Parte I)

Nove da manhã. Samiel encontrava-se no grande trono de mogno verde-escuro, esculpido lugubremente com vitoriosas chamas de fogo, relâmpagos e ondas imbatíveis.
Ainda não tinha tirado o manto castanho-escuro de pele de urso que lhe dava um certo ar imponente e altivo da manhã e por andar por casa. No enorme escritório escuro, ele olhava, atento para uma pequena bola de cristal, e, ocasionalmente, passava a mão comprida e lívida com as unhas grandes e finas, quase como se estivesse a acariciar o esférico. Com a outra mão, envolta numa luva de couro de cor-de-vinho, segurava numa proveta com uma rolha lá metida, onde um gás com uma estranha propriedade fosforescente azul-marinho borbulhava ao contacto com extracto de diamante derretido a mil graus num recipiente de vidro igualmente estrambólico, com as formas curvilíneas duma lamparina. Conseguia-se ver uma pena a trabalhar por si própria, a anotar minuciosamente notas num pergaminho. Quando o papel do rolo acabava, este era assinado pela mão de Samiel e posto numa das enormes prateleiras de madeira de carvalho onde brilhavam sinistras linhas, curvas e contracurvas roxas e escarlate.
Estava um silêncio sepulcral, um tanto ou quanto inquietante, mas o astuto e maligno Samiel não se deixava abater por aquele ambiente claustrofóbico.
Na verdade, até gostava da escuridão. Habituara-se a viver com ela, e, só, naqueles raros momentos, apreciava ficar a trabalhar nas suas poções e feitiços sem uma única luz.
De súbito, ele escutou um som, uma batida meio trémula, que poderia ser confundido com o barulho dum pica-pau.
- Sim? – Disse ele friamente, na sua voz aguda e seca, ainda concentrado nas fórmulas.
Uma rapariga, de trajes esfarrapados e rasgados, com olhos lacrimantes e cabelo desgrenhado abriu ligeiramente as portas brancas. Estava completamente deplorável. As suas vestes amarelas-torradas não combinavam nada com o esgalgado corpo, repleto de cicatrizes e feridas profundas, traumas antigos de cruéis e longas noites de tortura. Se não fossem as suas mãos de framboeseiro, dificilmente se poderia dizer que aquela rapariguinha era uma fada. Pequena, e de cabelos roxos longos, a dríade caminhava em passos exaustos e descalços, o que lhe tornava ainda mais dolorosa a existência.
Nas costas, evidenciavam grandes marcas que alguém lhe tinha cortado as asas, e, nos pés, haviam duas correntes fulgurantes de ferro que lhe prendiam os movimentos. Como criatura vegetal, a pobrezinha gemia de dor sempre que dava um único passo, e esse feitiço cruel era exactamente para essa finalidade, apenas para a fazer sofrer ainda mais!
Este era o aspecto duma ninfa acabada de chegar a um mês ao Castelo Negro, e pelos vistos, ainda não se tinha acostumado às exigências de Samiel.
A quanto o espírito sanguinário e perverso do Assassino do Amor podia chegar...! Desculpava-se aos homens mais sensíveis que era apenas uma forma de garantir que as Fadas não ficassem furiosas….E que também não lhes escapassem das garras e atrapalhassem os seus planos.
De pele morena e bem contornada, a jovem parecia um peixe fora-de-água naquele ambiente escuro e demasiado humano para o seu gosto.
- Meu amo... – Gaguejou ela, quase como que a soluçar. – Estão aqui dois deuses que gostavam de ter uma audiência convosco. Mando-os entrar?
Os olhos, geralmente insensíveis e cínicos de Samiel ergueram-se para a pobre escrava e, por uns momentos, ela conseguiu ver uma ponta de satisfação nos lábios secos dele.
Acenou com o indicador esquelético para que a rapariga aproximasse mais, pelo menos tão perto que ela conseguisse ouvir a respiração do bruxo.
O que ela fez prontamente, e mal deu conta, os dedos do seu cruel amo acarinhavam o rosto frágil.
- Excelente, minha querida escrava. – Sussurrou num tom maldoso. – Vai lá chamá-los, sim?
Ela correu o mais depressa que pode e abriu de par em par as portas para que dois jovens bem feitos avançassem com receio uns passos, como se estivessem a espreitar. Anúbis e Indra mal podiam respirar, pois o cheiro nauseabundo do tabaco que Samiel fumava sentia-se por todo o castelo. De manhã, quando se tinham encontrado, não esperavam que os boatos acerca da nefasta atmosfera que se vivia naquela casa fossem verdade.
Pelos vistos, o Assassino do Amor gostava tanto da escuridão como da morte.
Quando entraram, viram que o enorme Tigre da Sibéria repousava no gelado tapete e espreguiçava ociosamente, soltando um enorme rugido de sono, mesmo ao lado de Samiel, que, algumas vezes, ainda lhe atirava com naturalidade um pedaço de carne crua, provavelmente uma perna de uma dríade ou a coxa duma ninfa.
Os deuses sentiam-se enojados e horrorizados com aquela visão terrífica, à medida que tocavam na sua própria pele de galinha para ver se o bruxo ainda não lhes tinha lançado um feitiço.
Aquele lugar era insuportável, no entanto, Samiel sentia-se completamente à vontade, afinal de contas, era a sua casa.
Ele levantou-se de um salto, e, com as mãos juntas agora ambas descalças ao nível da cintura, indicou duas cadeiras para os dois jovens se sentarem.
A seguir, com um sorriso falso, tocou minuciosamente um pequeno sino de bronze que estava colocado na mesa.
O Tigre da Escuridão, obviamente também se levantou, e, num gesto de carinho, ronronou gentilmente pelas pernas do hindu, que tremeu ao sentir o pêlo áspero e curto a roçar nas traseiras.
Samiel apertou vigorosamente a mão como se fosse um camarada de Anúbis.
- As minhas servis saudações, Anúbis e Indra. – Cumprimentou ele, bem disposto. – E, já para não falar de desculpas. Sinto muito por não apreciarem o meu estilo de decoração.
Os dois deuses trocaram olhares de desprezo entre si, um pouco tensos, uma vez que encontrar o castelo não tinha sido propriamente uma canja de de galinha.
Relutantes em sentarem-se, abanaram as orelhas, e, meio nervosos, acabaram por confessar em uníssono:
- Na verdade, Senhor Di Euncätzio...
- Quanta cerimónia, cavalheiros! – Interrompeu Samiel divertido. – Por favor, tratem-me por Samiel. Além disso, não sou assim tão velho como certas fadas mexeriqueiras dizem.
Nesse momento, um rapaz de catorze anos, de cabeça baixa, e não mais alto que os joelhos de Anúbis; entrou pela sala com uma bandeja de prata numa mão e uma ânfora de dois litros noutra.
Parecia um pouco deformado, mas fez questão de servir silenciosamente com um olhar agradável os dois deuses com duas taças de aguardente.
Com um sinal de Samiel com as mãos, o engraçado anãozinho foi-se embora por uma passagem secreta escondida intencionalmente nas prateleiras.
Os dois deuses olharam por uma última vez para aquela estranha criatura infeliz dum nariz de cinco centímetros e grande, de um cabelo ruivo e coloração vermelha na pele queimada.
O que é que lhe teria acontecido...? Sentiram um enorme dó do pobre coitado rapazinho de quarenta centímetros de altura. Seria uma das atrozes criações do Assassino do Amor?

quarta-feira, 20 de fevereiro de 2008

Guerreiros da Justiça...


Por entre as árvores, ouvia-se passos apressados e velozes, tão rápidos como um relâmpago, e, embora não estivesse mau tempo, o rapaz de tronco forte e com uma coloração azul estranha pressentia que algo de errado se passara com aquela que mais amava. Adornado com uma armadura de ouro e fios de prata, com uma túnica de uma cor dourada resplandecente, o corajoso rapaz corria o mais depressa que podia, em socorro da sua bela donzela. Nariz fino e pequeno, olhos castanhos e encantadores, rosto quadrado e sobrancelhas expressivas com um cabelo negro a cair pelas costas era o aspecto de Indra, o Príncipe hindu com quem Eleonora estava prometida.
Armado com um arco e flecha às costas, o esbelto jovem percorria a floresta por toda a parte, mas nem sinal da sua adorada “Eli”.
Exasperado, e com suor a escorrer-lhe pela cara, só tinha a vontade de lançar um raio a Neptuno por não cumprir a sua promessa e o ter desonrado.
Segundo as antigas tradições atlantes, um matrimónio entre uma filha atlante e um estrangeiro é um compromisso que a nobre donzela aceita pela Nação, e, se na véspera da cerimónia do 1º dia ela faltar ao encontro com o noivo, isso significará um insulto pessoal ao esposo e ao reino que ele representa.
Sentia-se profundamente ultrajado, com sinais de irritação no lindo rosto de anjo, mas, no fundo, estava com pena de Eleonora. Afinal, ela não tinha culpa nenhuma daquelas idiotas tradições.
Além disso, como ideal do Povo Hindu, devia demonstrar ser sereno e sábio em todas as ocasiões, quer estas fossem boas ou más.
Suspirou, muito desgostoso. Quem é que poderia ter levado a sua luzinha para o paraíso?
De repente, um grande lobo castanho surgiu por detrás dele e cumprimentou-o, com a cauda a sacudir a brisa nocturna.
- Boa caçada, Senhor Indra. – Disse uma voz máscula de homem.
O príncipe riu-se à vontade, distraído, esquecendo-se por uns momentos que tinha perdido a sua Princesinha.
Parou rapidamente a correria, e, num abrir e fechar de olhos via um rapaz, cinco anos mais velho que ele, com uma túnica branca e que empunhava um grande machado flamejante. De tronco nu, Anúbis olhava para o amigo com um sorriso cúmplice no rosto.
Indra, muito contente por rever o grande e antigo companheiro de brincadeiras de meninice, apertou fortemente a mão do egípcio.
- Francamente, Anúbis! – Exclamou admirado. – Não esperava ver-vos...
- Calma aí! – Cortou o deus embalsamador de bom humor. – Podes tratar-me por “tu”. Somos irmãos de sangue, ou já não te lembras dos nossos tempos de crianças quando costumávamos brincar pela Floresta de Cristal?
Ao recordar-se dos tempos de menino, Indra também lembrou-se do sorriso inocente e nostálgico que Eleonora lhe dirigia sempre que o via.
Aqueles lábios carnudos e rosados que esboçava umas curvas agradáveis e doces, tão doces que até apetecia tocar.
Como sentia saudades da sua amada e, como ansiava poder apertá-la no seu terno abraço, acariciar aquelas faces puras de seda, tonificados com cacau e leite cada manhã.
Sentou-se, de pernas cruzadas, e com as mãos juntas meditativamente, como se estivesse a orar, e, num gesto pensativo, fechou lentamente os olhos.
Por uns minutos, ficou ali, com pensamentos sombrios a vir à superfície da mente. E se ela estivesse a correr mesmo algum perigo real...?
O que poderia fazer?! Sentia-se impotente por não ver mais uma vez o amoroso olhar de Eleonora. Na escuridão da noite, ele suspeitava que forças temíveis o observavam, de todos os lados. Homem ousado e de grande sentido de honra, Indra sabia o que é que o aguardava. Mal que se tinha apercebido que algo de mau acontecera a Eleonora, tinha evitado, de todas as formas, aquela opção. A floresta tinha muitos ouvidos, e ele já tinha ouvido falar de um bizarro “demónio negro em forma de humano”, cujos sinistros poderes eram clamados e receados pelas sílfides, as fadas do ar e da música.
Apenas um homem, suficientemente esperto, poderoso, calculista e malicioso como o Assassino do Amor seria capaz de dizer onde é que a sua querida e formosa princesa estaria.
Embora quisesse muito estar com a sua amada, nunca confiaria num bruxo tão traiçoeiro como Samiel.
Um arrepio passou por Anúbis mal leu os pensamentos do jovem e cuidadoso príncipe.
- Ih! – Indagou ele com calafrios na espinha. – Não vais pedir ajuda ao crápula do Assassino do Amor, pois não?
- Não tenho outra escolha. – Resignou Indra, um pouco preocupado, mas num tom decidido. – Mas esta noite...não. Provavelmente a besta já deve estar a dormir profundamente, ou a planear um roubo. Se quiseres acompanhar-me até ao Castelo Negro ao meio-dia, estás à vontade.
Anúbis deu generosamente a mão ao amigo para que este se levantasse, e tentou um leve sorriso.
- Sempre é melhor do que caçar serpentes nas margens do Nilo. – Disse ele, meio atrapalhado. – Então até daqui a um mês.
Depois das despedidas formais, os dois guerreiros combinaram encontrar-se nas margens do Rio Bênção às sete horas da manhã dentro de trinta dias, para que chegassem bem cedo à tenebrosa morada de Samiel.
A última coisa que queriam era interromper o almoço do Senhor da Magia Negra.
Assim, se chegassem bem cedo, teriam tempo para conseguirem convencer o feiticeiro a auxiliá-los na dura tarefa de desvendar o paradeiro de Eleonora.
Não seria fácil, mas, Indra, sagaz e esperto como era, teve a precaução de aconselhar Anúbis para que trouxesse todo o tipo de armas que conseguisse arranjar. Com Rwebertan Samiel Di Euncätzio, nunca se sabia quando é que viriam a precisar delas....!

sexta-feira, 15 de fevereiro de 2008

A venenosa Nereida!


Ora, todas as noites de lua cheia, Indra aparecia sob a forma dum fantástico elefante branco, e, com a sua tromba majestosa, levava-a para a sua morada distante onde, secretamente, se dava uma noite de amor e compaixão, onde quanta beleza fora contemplada em ambas as sociedades, tanto hindu, quanto atlante.
E aquela noite era especial, pois Indra arranjara finalmente coragem para pedir o consentimento de Neptuno para dar a sua filha.
Contudo, estava atrasado, pois já o Sol aparecia e Neptuno ainda não vira de volta os olhinhos mais queridos de Eleonora. Era uma antiga tradição o pai ver o noivo antes da noiva, mas, naquele caso, Neptuno já sabia que aqueles dois estavam pré-destinados um ao outro, desde que nasceram. Na verdade, Eleonora começou a ficar com medo, logo que os pássaros e os animais pararam de de se mexer. Aquilo não era obra de um lobo, dum tigre ou de uma serpente. Esperava que o seu valoroso príncipe encantado das Índias de vinte e três anos viesse buscá-la no seu elefante e vivessem felizes para sempre numa terra de conto de fadas.
Adorava os braços fortes de Indra que a afagereria tão carinhosamente; os seus lábios firmes que ela sonhava poder tocar mal ele dissesse o “sim” qual pequenas formigas delicadas; os seus olhos castanhos e honestos, o tronco másculo deste...Enfim, Eleonora era louca pelo deus, e, dentro de semanas, quando fizesse os seus dezassete anos, os destinos de ambos seriam unidos pelos céus divinos e pelo amor...!
Tão perdida estava ela naqueles devaneios infantis que nem reparou num peixe, prateado e esguio que se debatia na terra para sobreviver.
- Eleonora! – Chamou numa voz meiga, mas fraca. – Princesa Eleonora! Ajudai-me, por Deus!
A rapariga, inteligente como era, primeiro desconfiou dos pedidos de socorro daquele ser. Franziu o sobrolho ao se debruçar cuidadosamente na relva fresca. Viu o elegante peixe de cinquenta centímetros a sufocar, e a saltitar de um lado para o outro.
Como poderia um peixe falar...? Aquilo era quase tão impossível de acontecer como o estranho atraso do amigo Indra.
Encolheu os ombros, um pouco confusa e atrapalhada, sem saber o que havia de fazer ao coitado animal.
Correria o risco de confiar num peixe falante, ou faria a coisa mais certa e o devolveria ao seu verdadeiro habitat?
Era uma escolha um pouco difícil de fazer...Meditou durante um momento, a tentar ignorar a voz doce do peixe.
Como rapariga bondosa e misericordiosa que era, Eleonora não deixou de ter pena do pobrezinho.
Então, com um carinho e preocupação de mãe, apanhou-o delicadamente, e, num instante, deitou-o com muita cautela ao lago – o mais cauteloso que se pudesse ser quando o peixe enorme, um salmão, pesava quarenta quilos.
Mal que se viu novamente perto dos nenúfares brancos que o rodeavam, mergulhou feliz para as profundezas da água.
Quando a rapariga pensava que ele já não voltava sem se quer ter agradecido, deu de caras com uma enorme corrente de água que lhe molhou logo a cara.Sorriu, meio apanhada de surpresa, e observou com um ar divertido as espantosas acrobacias que o peixe executava, dentro e fora de água.
Os olhos azuis e cristalinos, separados do peixe, brilhavam de satisfação.
- Estou-vos muito agradecido, Princesa. – Disse ele dentro de água, numas bolhas que soltava e que ela compreendia perfeitamente. – Salvastes a minha vida, e digo-vos com todo o maior respeito, Vossa Alteza, que a vida dum peixe é algo simplesmente delicioso. Se houver algo em que eu possa retribuir, por favor, não hesitai em dizê-lo agora!
Eleonora abanou a cabeça humildemente, com os palmos das mãos levantados diante do peixe.
- Oh, eu não desejo riquezas nem poder, meu peixinho. – Respondeu a menina. – De facto, há apenas uma coisa que eu quero: o meu amor, o valente caçador Indra, ainda não voltou das suas desavenças no Reino da Ásia.
Com um ar suplicante, mas dócil, ela acrescentou, num tom receoso:
- Se sois um peixe viajante e experiente, podereis dizer-me onde é que ele está e se está bem de saúde?
O airoso e arisco peixe saltou da água por um momento e, fez uma coreografia gentil, abanando vigorosamente a barbatana caudal vermelha e achatada de um lado para o outro, em sinal de negação.
- Lamento, Eleonora. – Disse, numa voz, que não deixava de ser harmoniosa e agradável de se escutar. – Em toda a minha vida de peixe, nunca me deparei com semelhante nome. Porém, se necessitardes da minha...
Inesperadamente, o peixe desenhou torpemente um maravilhoso castelo, com pináculos tão altos como belos, com os seus movimentos na água, parecendo muito contente, para admiração da jovem fada.
- Já sei! – Exclamou. – Um feiticeiro branco amigo meu é um sábio conhecedor de todas as artes mágicas. Talvez ele consiga adivinhar onde o vosso amigo se encontra neste preciso momento.
Dito isto à pressa, ele mergulhou novamente até ao leito do lago e, num rabear misterioso, desapareceu por entre as algas como se fosse açúcar a diluído.
Curiosa como era, Eleonora seguiu-o até ser puxada subitamente por uma força sobrenatural debaixo de água, que lha deixou inconsciente!...
Uma gargalhada duma mulher maliciosa ecoou por entre as árvores da Floresta de Cristal, satisfeita por obter por fim a sua vingança!