segunda-feira, 5 de maio de 2008

O Senhor do Castelo (Parte I de III)


Ao chegar ao colossal átrio de cinquenta metros de altura, com uma gigantesca cúpula de vidro em forma de esfera, viu que o Sol incidia propositadamente sobre o centro do salão pentagonal, onde uma figura em mosaico dum tigre branco a chacinar, em cima de uma fada, os órgãos sexuais desta, que estagiava-se em sangue...!
Do lado direito do extenso átrio, havia duas portas às quais davam acesso a dois salões – Salão de Jantar e Biblioteca, segundo as placas. No esquerdo, haviam também duas portas, menos ricamente decoradas, que tinham os seguintes letreiros: “Escritório” e “Sala Proibida”.
Com o espaço totalmente vazio, um homem de média estatura, capuz amarelecerão e um manto de viagem sujo e empobrecido, com botas de cano alto castanhas, apoiado num bastão de um metro e sessenta, feito com madeira de um carvalheira, estava de pé no centro desse mesmo mosaico.
Então Eleonora apercebeu-se que era Jerininantus, o desprezível motorista e fiel braço-direito do Assassino do Amor.
Que estava ele a fazer numa casa tão fina como aquela...?
A jovem engoliu em seco: só esperava que as suas previsões não se tornassem em certezas!
Os dois bruxos anuíram simultaneamente com a cabeça, com olhares amarelos e a rirem-se baixinho.
A seguir, escoltaram a princesa até à primeira porta do lado direito, onde mal ela entrou, as portas fecharam-se rapidamente atrás de si!
Estava numa enorme sala rectangular, sem janelas, nem portas, com um grande candelabro de setecentas pedras preciosas a brilharem o escuro recinto.
Quatro mesas compridas feitas de madeira estavam praticamente dispostas em forma de “E”, com todas cadeiras pequenas numa madeira vermelha. Na base da letra, um homem alto estava refastelado num grande trono de madeira preto. Neste trono estavam esculpidos em baixo-relevo um “D” vermelho e um “S” que serpenteava pela outra letra, dispostos sobre um tigre prateado com riscas azuis, de com braços fortes e altos. Debaixo dele, havia uma cauda branca às riscas pretas que fazia uns certos barulhos estranhos.
O seu rosto estava coberto pelas sombras do capuz preto, mas mesmo assim, ficava extremamente elegante e, de certa forma, as roupas escuras com estranhas linhas vermelhas de sangue e roxo davam-lhe um certo ar poderoso. Com um estranho objecto prateado a pender da luva direita de cabedal, igualmente roxo, o tal feiticeiro tinha um aspecto deveras sinistro. No entanto, a princesa não se deixou intimidar.
Sem esperar que a chamassem, a rapariga avançou em direcção do feiticeiro, com uma altivez quase etérea, o vestido a ondular à sua volta, de forma adorável. Apesar de, no fundo estar receosa e preocupada, não havia dúvida que era uma das filhas da velha Rainha Melnjar das Fadas, Senhora da grandiosa Floresta de Cristal, Esposa do Rei Neptuno.
O feiticeiro soprou uma misteriosa baforada de fumo para a cara da corajosa menina.
- Bem vinda, Princesa Eleonora. – Disse Samiel com um sorriso falso e uma voz aguda, muito familiar a Eleonora, parecia já a ter ouvido num tom mais grave e masculino, quando Samiel era ainda um feiticeiro normal. Retirou das vestes uma adaga de jade com a qual arrancou cuidadosamente qual artesão a refinar os pormenores duma jóia as correntes nos pés e mãos de Eleonora, e, mal a lâmina passou pelas ferrugentas e desconfortáveis algemas, estas desfizeram-se em pó, que a boquilha presa na boca de Samiel aspirou. – Já não precisas delas, agora estás comigo.
Depois, examinou atentamente os pulsos de Eleonora por um momento.
«…como eram bonitos e frágeis, como pequenos pastéis morenos, recheados de mil pozinhos de chocolate de avelã, com um uma pitada de açúcar escondido nos lagos da floresta, símbolos de humildade e formosura eram, aquelas canas de canela e mel, que tive o prazer de cheirar e sentir. Oh, como a seta do Cupido me atingiu naqueles trágicos instantes. Aquele aroma a canela e pêssego lembrava-me as românticas recordações de Samielzinho, menino, aprendiz de chocolateiro…» e ergueu o olhar para a única porta ao longe.
– Tsc, tsc, tsc. Jerininantus! Nimtauk! – Ordenou alto num tom irritado os nomes dos seus mais fiéis lacaios.
Os dois homens andaram em passos apressados para irem ter com o seu mestre, e ajoelharam-se numa vénia profunda.
- Sim, Patrão? – Disseram ambos com olhares vazios e em tons respeitosos.
- Vocês fizeram um trabalho deficiente. Usaram demasiada força ao trazerem a Princesa Eleonora, primeiro no fim da batalha, agora, quando tu, Nimtauk pediste que te seguisse. Os pulsos da princesa estão não só esfolados, mas rasgados. E há sangue fresco nas feridas. Mesmo com um banho, é possível ver as cicatrizes.
Samiel quase parecia zangado, e, atrás de si, a princesa ouviu um comentário atrapalhado por parte de Nimtauk:
- Perdoai-nos, Mestre...
O feiticeiro agitou a cigarrilha de forma quase desinteressada, e, olhando com incrível crueldade os lacaios, com os braços cruzados, deitou uma fumarada arrogante para as caras dos subordinados.
- No Castelo Negro, não há lugar para vencidos. – Comentou ele de forma fria e autoritária. – Mas, uma vez que sou generoso, vou dar-vos uma última oportunidade. Se algum de vós cometer mais um erro que seja, fiquem a saber que o CASTIGO que vos estará reservado será doloroso e prolongado!
Os dois carrascos estremeceram ao ouvirem estas palavras. Nenhum deles tinha-o visto tão ameaçador como naquela altura.
Levantaram-se cuidadosamente, e, permaneceram de calcanhares juntos até que este lhes disse com um sorriso irónico:
- Bom...! Afinal, até fizeram um bom trabalho ao dominarem a princesa, uma vez que, se fosse Sua Majestade, a Rainha Melnjar, já estariam sem mãos para o resto da vida.....
Já lhes ia ordenar ainda mais alguma coisa, se não fosse a interrupção ousada de Eleonora.
- Deixemo-nos disto, Assassino do Amor! – Disse ela, numa voz tão convicta e alta, que até Nimtauk e Jerininantus desviaram o olhar, muito surpresos com a valentia dela. – O que é pretendeis realmente, agora que me tendes nas vossas mãos?
Samiel levantou-se de seguida, e, fitou o seu olhar no de Eleonora, permanecendo contudo no lugar, e, tirou rapidamente o capuz.
- Para já, apenas conversar convosco, Vossa Alteza. – Respondeu ele calmamente, num tom agradável. Só aí, é que Eleonora se apercebeu do quanto diferente Samiel estava da primeira vez que o vira, há uns anos, quando ela ainda era uma criança.
O seu rosto oval, antes belo e jovem, estava desfigurado por enormes queimaduras e terríveis cicatrizes, que se prolongavam pelo pescoço, mas que quase não chegavam ao tronco. Eris tinha sido misericordiosa em poupar o resto do corpo do bruxo a semelhante castigo. O seu cabelo ruivo cor-de-fogo, outrora longo e comprido, estava reduzido a um cabelo rebelde e que não chegava aos ombros por uma unha negra. No entanto, os lábios permaneciam os mesmos sempre: tentadores e efeminados, um bocado seco.
O seu aspecto era tão horrendo que Eleonora assustou-se.
Samiel esboçou um pequeno sorriso, talvez o primeiro em que não havia nada de maldoso, e olhou para os dois ajudantes, mais um grupo de cinco demónios que os observavam.
- Mas ainda estão aqui, minha cambada de imbecis? – Perguntou autoritariamente numa voz alta. – Voltem ao trabalho e vigiem as portas. Nada disto vos interessa, escumalha. Depois asserto contas com vocês e o vosso líder mentecapto!
A sua voz suou como um poderoso trovão, e atingiu de rompante os acéfalos demónios, que logo ficaram surdos.
Olhou por um momento para a rapariga, já sentada ao seu lado direito, e esboçou um sorriso cínico, acrescentou:
- Só para o caso de termos certos convidados indesejados...
Imediatamente, Jerininantus, Nimtauk e os demónios desviaram a atenção, e, num olhar solene apressado, dirigiram-se às portas, fechando-as rapidamente.

4 comentários:

dimitrik disse...

Olá!
Excelente seu blog.
Aceita uma parceria? Troca de banners? Meu blog é www.sopadecerebro.com

abs
Dimitri

dimitrik disse...

Obrigado!
Seu link já está l=á no blog também. ;-)

abraços!

Anónimo disse...

Suas descrições do ambiente continuam geniais e colocando o leitor bem no centro da ação.

Vejamos o que nos reserva os próximos textos excelentes.

Anónimo disse...

necessario verificar:)