quinta-feira, 6 de outubro de 2011

Lentamente, a Lua se esconde...

Roshini observava, esfregava os olhos, fechava-os e continuava a ver, atónita e com a raiva a subir-lhe às tempôras, o seu tio a seduzir aquela rapariga inocente. Ele não só queria conquistar o Império da Bellanária através da Lua dos Sonhos, queria destrui-lo através da Guerra entre as várias classes e o Norte e o Sul! Que podia fazer, o que poderia fazer?
- Desejais um pouco de Frambinam, Princesa Sarvahdinada? - A voz falsete e compassada, monocórdica do homem sussurrou, ao estalar os dedos e prontamente, mãos invisíveis trouxeram uma garrafa de cristal adornada com uma fada pintada de vermelho.


A princesa corou, espantada. Mas há pouco tempo ele não queria violá-la? Tinha apenas dezassete anos, e não sabía que as bebidas alcoólicas podem derreter a timidez de qualquer um. Também estava muito confusa: aonde é que estaria o homem que a tinha salvado quando ela ainda tinha dez anos? Com o cabelo negro a pender dos ombros de chocolate, ela fixou o seu olhar de canela no homem alto e forte, com um corpo que se assemelhava ao mármore branco e frio! Com aquele rosto de mais de mil anos, o nariz adunco, os olhos verdes a observarem-na cuidadosamente como se ela fosse uma obra de arte, os lábios a desejarem-na com um sorriso carnívoro e sedutor...tudo isso lhe fazía uma enorme confusão. E mesmo que ainda não tivesse provado o licor de framboesa, já sentia uma certa tontura, uma loucura que lhe dava uma enorme vergonha!


- S-sim... - Ela murmurou, num suspiro, a perguntar-se como é que um homem tão feio de cara podía ser tão atraente no corpo, naquele corpo esguio e atlético.


As garras dele passearam no corpo dela, enquanto ela respirava bem fundo, sentindo o sangue a subir-lhe à cabeça a uma velocidade estonteante. Di Euncätzio Samiel - era a primeira vez que se sentia orgulhoso pelo nome que tinha, e a pronúncia em Chinês tornava-o cego ao amor. Do fundo daquilo que ele tinha, apodrecido no interior do seu peito, ele amava realmente a princesa humana, e mesmo que a desonrasse, não tinha remorsos nenhuns acerca disso. Os dentes afiados dele lamberam com prazer o licor que deitou por cima dos ombros dela, fazendo com que Sarvahdinada tivesse um calafrio. O cheiro a álcool fez a sua pele arder, e no entanto, o sabor a framboesa fresca era o mesmo. Recordou-lhe daquele dia em que o tinha visto, há sete anos atrás. Esquisito como aquilo a fazia sentir-se bem e nervosa ao mesmo tempo. No entanto, isso também lhe fez lembrar que tinha sido por causa das Nagas e de Rusalka que a Guerra tinha começado. E o país bellante...seria que o Assassino do Amor já tinha previsto aquilo tudo...? Seria que ele a tinha conduzido até Kelzharam de propósito?

Aquela figura anónima, aquele homem que se escondia por detrás daquelas vestes sumptuosas e imponentes...seria ele capaz de amar? Tocou ao de leve o rosto oval dele...era tão diferente do dela, enrugado, como se fosse um velho pergaminho de bambu. O nariz adunco inalou profundamente o perfume que vinha do pescoço dela.

- Como é que é possível...? Como é que é possível gostardes assim tanto de mim se odiais o Império e a cidade onde eu cresci? - Ela exclamou num tom muito triste, cheia de saudades dos seus pais e da cidade que a tinha visto nascer e tornar-se naquela rapariguinha que desaparecera, há sete anos atrás.

As garras do bruxo limitaram-se a acariciar aquelas costas frágeis e delicadas, consequentemente fazendo com que a princesa tivesse um ligeiro calafrio. O hálito do Assassino do Amor chegou às orelhas dela, naquela voz falsete, metálica e fria como uma adaga letal!

- Só sei que esses teus olhos de almíscar me enfeitiçam, princesa. - Aquela voz, tão sibilante, tão intensa, fez com que um súbito calor viesse à espinha da jovem.

Sarvahdinada quase que gaguejou quando ia começar a falar, o calor da água vulcânica fazendo com que os dedos dela se apercebessem da pele áspera e masculina do Assassino do Amor quando encostou, sem querer, a cabeça perto da dele.

- Os meus olhos? Que têm eles de tão especial?

- Ainda há inocência neles... - Ele murmurou num tom que podia passar por carinhoso. - Não deve haver uma criatura mais pura como tu, minha querida!

Uma vez mais, ela corou, e suspirou, e sentiu uma estranha vontade de o abraçar. Mas seria correcto?




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