domingo, 29 de novembro de 2009

Um lírio selvagem... (Parte 2)

Subitamente, uma onda de gelo assombrou aquele lugar, como se as tempestades fossem o menor de todos os problemas…! Parecia encurralada, como se, repentinamente, toda aquela luz a fosse engolir. O medieval e barrocal átrio pareciam agora o interior de um templo da morte, na qual ramos de incenso e várias lâmpadas asseguravam um aroma estranho, mas soporífero e agradável, onde ela seria sacrificada a Deus. As velas apagaram-se, como que sopradas por um vento frio, vindo do Norte, e, mal ela pudesse notar um vulto vestido numa casaca branca e prateada apareceu diante de si, um homem alto, numa túnica azul-celeste, com sombras de bege magníficos e tão suaves e doces como o mel.

Uns olhos azuis, belos como duas safiras, pareciam reluzir diante dela, como que se fossem a única coisa que se sobressaia sobre aquele rosto, macio, que se lhe tocássemos, teríamos uma sensação de estarmos a beijar uma estátua grega de mármore frio. Mas o sorriso, o sorriso tinha algo de cavalheiresco e fino. E ela sentiu que estava diante de um génio, um descendente da raça solar dos Homens-Águia Brancos.

Os brilhantes, vermelhos, em forma de labaredas, azuis e vermelhas, como rubis e safiras, espalhavam-se por toda a vestimenta do homem, enquanto que, sobre o tronco, usava um grande colar de homem, onde, três círculos de bronze cintilavam, na luz da noite.

As mãos eram brancas, tão pálidas e fortes, com sinais de que estavam bem limpas e cuidadas. Apavorada, ela nem sabia o que havia de dizer…! A boca estava seca, sem sequer mexer um único músculo.

Com os braços caídos, ela viu que as mãos, aquelas mãos de anjo, ressequidas e secas como ruínas de um antigo templo, lhe tocavam nas costas, nos braços, nas mãos, num gesto semelhante a uma carícia fraternal.

De súbito, ela apercebeu-se que queria saber quem ousava fazer tais compromissos, e, então, só então, se apercebeu, que se estava a casar-se! Um casamento forçado, pois, naquela altura, as tradições bellantes mandavam, que caso fosse um casamento forçado, que o marido apenas inspeccionasse a noiva na altura que ela chegasse aos domínios dele. O feiticeiro tocava nela, mas não era um carinho que não fosse merecedor de um desejo. Aqui, as palavras não eram precisas, pelo que ficou aliviada, pois, quando ele reparou quem ela realmente era, ele acenou com a cabeça afirmativamente, e, dirigindo-se aos criados, que, insensíveis como estátuas, o escutavam atentamente, falou numa língua estranha, arrevesada para ela, que Añuli não conseguiu compreender:

- Ja, dieses ist meine Ehefrau. – A sua voz era grave, mas com um sotaque vienense, como se fossem as notas de uma harpa que não tivesse cordas. Algo estranho, e suave, no entanto, que era, de certa maneira, encantador.

Os Empregados falaram com ele, e, naquela língua, que ela não sabia falar, parecia que estavam satisfeitos, pelos meios sorrisos nos seus rostos brancos.

De repente, alguém falou com ela em Português, era uma empregada, de cabelos dourados como o trigo, e com olhos tão azuis como o oceano, quente, e aconchegador.

Levando uma das suas mãos, brancas e calmas, à testa negra de Añuli, reparou que ela estava a suar.

- Estais bem, menina? – Ao ver que os acompanhantes de mármore da jovem elfo tinham desaparecido, a mulher alta loura sorriu. – Sei que tudo parece confuso e muito bizarro para vós, mas, em breve, ireis compreender tudo.

- Quem era aquele homem? – Perguntou, por fim, ela, a medo, ousando falar na sua língua paterna.

A criada de cabelos tão doces como o mel, respondeu, num ar mais altivo, e, preocupado, como se estivesse orgulhosa, e no entanto, com um respeito, de quem se deveria dar a um rei.

Baixando a cabeça, ela disse, com um ar sombrio, porém, solene:

- É o nosso senhor, Sua Senhoria, o Duque Rüdiger Von Tifon, soberano de todas as terras da Cidade Perdida e Visconde Enviado do Reinado da Prússia, agora nomeado Rei dos Bruxos.

Añuli franziu as sobrancelhas, espantada, mas ao mesmo tempo, fascinada com aquela língua que ali, se falava. Parecia que se arranhava a garganta ao se falar, enquanto que no Português, era mais nasalado.

- Que nome tão estranho para um homem nobre…! – Exclamou ela, desconfiada, de mãos cruzadas. – Quer dizer, ele tem agora mesmo poderes sobre mim?...

- Não é suficiente para a tornar sua, mas sim, ele tem direitos sobre a senhora, enquanto hóspede dele.

domingo, 1 de novembro de 2009

Um Castelo Democrático (especial Dia das Bruxas)



Tenho um especial carinho pelos Tienenses, aqueles que utilizam o termo "menino" e "menina", para os filhos e para os que mais amam.

Se "A alma de um povo está na sua cultura", então a alma dos Tienenses está concentrada numa misturada de vários povos, incluindo o português. Não é para me gabar, nem nada, mas achei engraçado ver um típico lisboeta, com as roupas de uma pessoa lá do norte da Europa, com a excentricidade e fervor ao trabalho de um homem russo, e com a multiculturalidade de um londrino. Assim nasce o Tienense, com a mania japonesa de contar histórias de terror e um humor tão negro e vermelho como o antigo sangue azteca.

Uma vez que os Tienenses estiveram muito tempo sobre a "alçada comunista", seria normal encontrar um pouco de ruínas pós-guerra da antiga Cyborg Town. Mas também se encontra o moderno, e o progresso numa cidade destas. Quando, lá no norte, eu pergunto se conhecem um típico bellante, então todos dirão a palavra chave: organização e burocracia. Os Bellantes gostam muito de organizar tudo, nem que seja a nova praça que foi construída na Nova Losjafhden, que, apesar de ser um monumento ao mau gosto, é muito bonita.

Não desfazendo o meu anterior comentário, o Castelo Negro é aonde toda esta energia e alegria sem descanso têm o seu núcleo, principalmente pelas mulheres e pelo protocolo antigo já é de há imenso tempo. É por isso que opto por receber os meus convidados através de uma série de processos burocráticos, do que ter alguém a apontar nos meus coisos logo na entrada. Creio que é a única maneira de nós, Bruxos, sermos civilizados; optarmos por uma solução que seja acertada e justa para todas as classes.

Nos tempos da Tienânia (1949-1989), os bruxos do Norte conseguiam entender-se muito bem entre as outras classes, através do programa "Vinho de Framboesa". Aliás, a reabertura em 1979 do famoso salão Cavalheiro como "A Estrela de Swertyhina" não foi para outra coisa. As pessoas precisam de distrair-se, trabalhar e recuperar a antiga honra na sua cidade como "A Pérola do Império Bellante", naqueles tempos dourados antes das guerras e dos conflitos contra os imigrantes, nos tempos de 1900-1930. Swertyhina, a Senhora do Sangue Vermelho, a nossa Mãe da cidade Cyborg Town foi especialmente idolatrada, nos maus e nos bons momentos. Por estar associada ao sangue, nos tempos da Tienânia, Swertyhina foi considerada uma heroína santa para muitos - a personificação da rapariga nobre, guardiã do Rio Bênção, que desiste de todas as riquezas mundanas para conquistar Tsesustan, o deus eremita - e uma vilã demoníaca para outros - a terrível deusa negra que ameaça destruir os antigos cultos que proíbem o sacrifício de sangue humano aos Deuses. Porque é que não vemos esta senhora não como uma encarnação do mal ou do bem, mas sim como algo misturado: a Justiça!
É isso o que eu quero, para um castelo mais democrático e feliz...!

Kasimir Ivanovitch Malaghetiyev in News Zone, trecho de "Ensaio sobre A Condição Democrática entre Classes"